Na verdade, uma moratória sobre a geoengenharia solar continuará em vigor após discussões acaloradas na Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente terem terminado em um impasse. O debate é sobre permitir que as pessoas lançem partículas no céu que refletiriam a luz solar de volta ao espaço, aparentemente resfriando o planeta. É uma tática altamente contestada para enfrentar a mudança climática. A geoengenharia não faz nada para parar o que realmente está causando o problema: emissões de gases de efeito estufa provenientes de combustíveis fósseis. E brincar com a composição de nosso planeta e atmosfera para refletir a radiação solar poderia levar a consequências imprevistas que os cientistas ainda estão tentando entender. Afinal, as mudanças climáticas que já estamos experimentando – na forma de mares em elevação, clima extremo e outros desastres – podem ser consideradas resultado de uma geoengenharia não intencional através da poluição por gases de efeito estufa.
A humanidade acabou de experimentar seu ano mais quente já registrado, com temperaturas crescentes em 2023 provavelmente excedendo as de pelo menos os últimos 100.000 anos. E apesar de estarmos presos no que é essencialmente uma casa em chamas, as emissões de aquecimento planetário provenientes de nosso uso de energia ainda atingiram um recorde no ano passado. Levando isso em consideração, defensores da pesquisa de geoengenharia solar dizem ser hora de considerar até as opções mais estranhas para reduzir o calor. Uma startup malandra – na verdade apenas um par de caras assando fungicida e lançando o gás resultante de dióxido de enxofre em balões meteorológicos – deixou muita gente brava ao seguir em frente com seus experimentos de geoengenharia solar no México e nos EUA desde 2022. A empresa está basicamente tentando imitar a maneira como erupções vulcânicas podem temporariamente resfriar o planeta, liberando dióxido de enxofre, que se mistura com a água na estratosfera para criar uma camada aerossol refletora nebulosa.
Grupos de pesquisa reais interessados no potencial da geoengenharia solar têm sido muito mais cautelosos – evitando testes no mundo real até terem uma melhor noção dos possíveis obstáculos. Por enquanto, ninguém realmente sabe o que pode acontecer com grandes projetos de geoengenharia. Pode ajudar a resfriar o planeta; também pode rasgar o ozônio sobre a Antártica. Tudo isso levou a uma série de tentativas de estabelecer alguns parâmetros para projetos de geoengenharia solar. Os experimentos da startup no ano passado provavelmente foram pequenos demais para ter muito impacto. Mas se um grupo mais capaz ou governo decidisse jogar cautela aos ventos e tentar algo semelhante em maior escala, poderia ter consequências para todo o planeta.
Já existe de fato uma moratória global nas grandes escalas de geoengenharia que foi acordada durante uma conferência das Nações Unidas sobre biodiversidade em 2010. Mas está desatualizada e a linguagem é vaga. Não se aplica a pequenos experimentos e poderia se limitar a esforços de geoengenharia solar considerados prejudiciais à biodiversidade. Sem regras internacionais mais rígidas para impedir experimentos fora de controle, os governos poderiam ficar jogando um espantalho com startups que podem mover suas operações de um lugar para outro. O México disse que proibiria futuros experimentos após os lançamentos de balões da startup de assado de fungicida dentro de suas fronteiras. A startup apenas lançou mais balões na Califórnia no ano seguinte.
Um painel de peritos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) publicou um relatório em 2023 dizendo que, “Com muitas incógnitas e riscos, há uma forte necessidade de estabelecer um processo científico internacional de revisão para identificar cenários, consequências, incertezas e lacunas de conhecimento”. Em junho, a União Europeia propôs um quadro internacional para regular os esforços de geoengenharia. A Suíça foi à Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente em Nairóbi, Quênia, esta semana, propondo um plano para estabelecer um painel de especialistas para estudar os “riscos e oportunidades” da geoengenharia solar, informa a Climate Home News. Mas teria sido rejeitada por um grupo de nações africanas e das ilhas do Pacífico, México e Colômbia. Os oponentes viram essa proposta como uma tentativa velada de legitimar a geoengenharia solar. Alguns países e defensores ambientais estão pressionando por um acordo mais rígido que proibiria a geoengenharia solar de forma definitiva. Mas isso também não se materializou na cimeira em Nairóbi nesta semana.
“Tecnologias de Modificação da Radiação Solar (SRM) são perigosas e não têm qualquer papel a desempenhar em nosso futuro comum. Essas tecnologias não podem abordar as causas fundamentais da crise climática e, em vez disso, permitiriam que grandes poluidores atrasassem a necessidade urgente de eliminação gradual dos combustíveis fósseis”, disse Mary Church, líder da campanha de geoengenharia no Centro de Direito Ambiental Internacional (CIEL), em um comunicado ontem. Após toda essa troca de argumentos, a moratória de fato de 2010 sobre a geoengenharia continua sendo o único acordo internacional entre startups ousadas e seus planos de tentar salvar – ou talvez colocar em perigo – o mundo.
#tecnologia #primeirapágina #dasAlteraçõesClimáticas #ambiente #Ciência #política #regulamento #política